Querido diário:
O dia da liberdade nada diz para mim.
Não estou em casa, fui levada sem estar na minha perfeita consciência. Hoje às 6 horas da manha (hora habitual da conversa entre ele e a minha avó), ela acordou-me dizendo “Bom dia minha querida Yáviël, hoje vamos fazer uma viagem, por isso tens de te levantar, o Carnil espera-nos”. Eu levantei-me e preparei as coisas como um robô, ainda estava mais a dormir do que propriamente acordada.
O seu carro era desportivo o que não condizia nada com a sua aparência. Quando o vi acordei realmente e comecei a “disparatar” como a minha avó lhe chama e comecei assim:
-Mas afinal para onde vamos?
-Vamos para o Oeste Azul. – respondeu a minha avó com cara de que quase me matava.
-Oeste Azul? Mas onde fica isso?
-É um sitio que vais adorar. Lá ninguém te discrimina, não és gozada e os nomes são quase iguais aos nossos. – respondeu ele e a partir daí disparatei mesmo:
-Mas quem és tu?
-Sou o Carnil mas podes tratar-me por Erat Suithon ou simplesmente Erat. Serei o teu companheiro nos próximos tempos.
-Companheiro de que?
Ele ficou com as bochechas rosadas.
-Podes chamar-me mais mestre e o “companheiro” é nesse sentido. – acabou por responder.
-Mestre? Podem explicar-me o que se está a passar aqui?
-Vais seguir os passos que o teu pai seguiu. Ele deixou-me este cargo antes de partir. Esta justificação é suficiente para ti?
-Sim é.
Calei-me que nem um ratinho e esperei. Paramos em frente a uma casa muito degradada, tinha vidros e as portas partidos. Com manchas de que tinha havido uma explosão ou incêndio e ele falou:
-É aqui!
-É aqui? É aqui o Oeste Azul? É isto?
-Não, isto é a entrada para o Oeste Azul. – respondeu ele e piscou-me o olho. – mas principalmente é onde nasceste.
Eu olhei para ele. Não estava muito feliz, aliás a cara dele apresentava uma tristeza enorme.
-Onde nasci? A sério? Bem só por causa disso esta casa parece que ganhou cor. Conta tudo, conta por favor.
-Carnil? É muito cedo. – disse a minha avó.
-Não, tenho a certeza que o Haldir queria que lhe contasse agora e neste momento.
A minha avó assentiu com a cabeça em concordância.
-Foi no dia 16 de Fevereiro, estávamos todos aqui, a tua avó, eu e o resto da tua família. A minha mãe estava no quarto com a tua a ajuda-la. Eram as melhores amigas desde crianças. Ainda não havia maternidades nem hospitais. A tenção acumulava-se toda nesta sala, onde estamos agora.
Era uma sala muito degradada ainda tinha bocados dos armários, não tinha nada sofisticado nem de tecnologias por mais velhas que fossem, os “candeeiros” eram de óleo como antigamente o que me confundia mais as ideias.
-Até que ouvimos o chorar de um bebé. O teu pai, Haldir, levantou-se logo e a minha mãe veio á porta. E disse “Parabéns, é uma menina muito bonita e saudável, mas deveis aguardar mais um pouco”. O teu pai impaciente lá esperou mais um bocadinho. Mas demoraram mais do que a gente esperava. O teu pai cansou-se de esperar e foi lá dentro, quando lá chegou a minha mãe disse-lhe “Haldir, desculpa, a tua mulher não resistiu. Mas a menina sobreviveu.”. O teu pai deu um berro, um murro na parede e saiu a correr. Nunca ninguém o tinha visto a chorar mas naquele dia a família inteira viu uma lágrima do grande Haldir cair no chão daquele corredor.
Olhei e a lágrima ainda parecia existir. Era como se parte da alma do meu pai estivesse ali presente e quando entramos no quarto onde eu nasci foi o mesmo mas relativamente á minha mãe. Era como se sempre a tivesse conhecido e ela estivesse naquele preciso momento a meu lado.
-E depois? - perguntei eu a tocar nos restos de lençóis que existiam.
-O teu pai não te quis ver, não queria saber de ti. Durante um ano nunca te quis ver. Quando tentamos que ele te visse ele perdia a cabeça e fugia sempre para o Oeste Azul e descarregava em todos os seus guerreiros. Os treinos eram muito mais intensos e eu levei com muitos deles.
Fiquei muito triste ao saber que o meu orgulho de pai me tinha renegado ao inicio e nem me queria. Quase que chorava mas parece que nesse aspecto era como o meu pai, não chorava quando queria e mais precisava.
-Mas passado esse ano nunca mais te abandonou. Ia contigo para os treinos e tudo. Eu era o melhor guerreiro aprendiz dele, segundo o que ele dizia, e quando completas-te o teu segundo ano de idade ele disse a frente de todos, “Se já não for vivo o mestre da minha Filha será o Carnil Varnion Ráneron pois desde que apareceu nas minhas mãos é o melhor guerreiro aprendiz e tenho gosto em ensinar com ele. Acredito que venha a ser o capitão das tropas de Oeste Azul e confio-lhe este cargo como lhe confio a mão dela caso vocês queiram”.
Ele comoveu-se ao dizer aquelas palavras, expressava orgulho mas saudade apesar de tudo.
-E foi assim que te tornaste meu mestre certo? – perguntei eu.
-Sim e teu protector também. Mas isso ele pediu-me mais tarde. – respondeu ele com um pequeno sorriso.
-Mas a historia não acaba aqui pois não? – Respondi eu a temer que alguma coisa de horrível me esperasse.
-Infelizmente não.
-CARNIL! Já chega! – Gritou a minha avó.
-Avó, deixe que ele conte, é importante para mim!
Ela ainda tentou impedir mas não se pronunciou mais.
-Num dia de Inverno, estavas quase a completar os teus sete aninhos, estava eu a brincar contigo aqui, nesta pequena sala e o teu pai entrou aflito e disse “Erat, vai embora com a Yáviël, rápido o Rathir veio á procura dela, vai para Oeste Azul! CORRE” eu sai a correr contigo da sala e fomos para o teu quarto que fica aqui.
Ele mostrou a divisão, estava igualmente degradada á excepção a um espelho, parecia banhado em ouro, era grande e muito trabalhado. Ele continuou:
-Eu deixei-te aqui no chão e fui ter com o teu pai, estava numa enorme luta com Rathir e mais dois dos seus soldados. Quando comecei a ajuda-lo ao que matei os dois soldados que estavam a mais ele gritou-me “FOGE COM A YÁVIËL” eu quando me ia a virar Rathir dá a ultima golpada no teu pai e vem a correr atrás de mim. Eu corri o mais que pude cheguei aqui ao quarto peguei em ti e entramos por este espelho. Este espelho é a entrada para Oeste Azul.
-Mas eu não me lembro.
-Pois não. Apenas te lembras dos bons momentos com o teu pai até esses sete anos. Isso fez parte do trabalho da tua avó. Ela nunca quis que soubesses e pronto, são decisões. Bem, estás pronta?
-Posso fazer uma pergunta antes de irmos? – perguntei.
-Podes.
-Porque é que o Rathir andava atrás de mim!
-Porque és filha do Comandante das tropas de Oeste e Este Azul. Para além de seres especial és a herdeira de tudo aquilo que ele possuía e o ex-comandante de Este Azul era o Rathir o que fez com que ele te quisesse matar, a ti e a ele.
-E sou especial porquê?
-Porque normalmente as filhas ou filhos dos comandantes têm um poder especial. No caso do teu pai era guerreiro, ele era um excelente guerreiro, a única justificação que tenho para que Rathir o tenha conseguido matar foi porque estava fraco por ti.
-Ah! Está bem. Mas se eu tinha sete anos e eu tenho agora 16 quem é que ficou com as coisas do meu pai até hoje?
-Fiquei eu e a tua avó. Fomos os únicos que teu pai confiara.
-Agora sim, acho que já estou pronta.
-Então vamos.
Entramos pelo espelho e era um mundo completamente diferente. Aqui tinham todos os mesmo defeitos que eu, as orelhas pontiagudas e ouvi o Carnil chamar muitos homens e mulheres que me olhavam, sorriam e diziam “É ela” e os seus nomes também eram estranhos.
O ar aqui é leve, á muito verde, muitas plantas e árvores, o sol brilha muito mais e o céu é mais azul tão claro e tão puro. As pessoas são muito simpáticas, usam todas túnicas, mas cada uma com a sua originalidade e sorriem quando passamos por elas. Chegamos a um palácio enorme azul. E o Carnil disse:
-Bem esta é a tua verdadeira casa.
Eu fiquei espantada a olhar, entramos e tinha um mordomo e duas empregadas á entrada que me deram as boas-vindas como se fosse uma deusa. Já tinha um quarto para mim e segundo eles decorado pelo meu pai, o que me deu mais gosto de me deitar aqui. Já fomos jantar e eles agora deixaram-me aqui a descansar e a interiorizar tudo o que tinha descoberto hoje. Portanto decidi vir escrever, acho que estes dias vou estar muito ocupada para isso, mas não me esqueço e todos os dias. Até amanhã.
Segunda-Feira, 03 de Maio de 2010